A enxaqueca é muito mais do que uma dor. É uma doença incapacitante onde a automedicação pode causar seu agravamento e o acompanhamento adequado com o neurologista é fundamental para melhora da qualidade de vida
O que é enxaqueca?
A enxaqueca, também conhecida como migrânea, é uma doença na qual muitos sintomas podem estar presentes, sendo o principal deles a dor de cabeça (também chamada de cefaléia).
Para melhor entendimento, é como se fosse entregue uma mala cheia a cada portador da doença, porém não se sabe o conteúdo das malas e o conteúdo de uma pode ser distinto da outra. Deste modo, cada um precisa descobrir o que tem dentro de sua mala para melhor organizá-la.
Na enxaqueca, cada paciente precisa descobrir os sintomas com os quais ela se manifesta e os possíveis gatilhos para que a mesma possa ser tratada da melhor forma. A desinformação e o tratamento inadequados podem atrasar em anos o diagnóstico. Consequentemente a pessoa pode sofrer por anos com uma doença não controlada; a enxaqueca muitas vezes é considerada como frescura, preguiça, desculpa para não realizar tarefas, quando na verdade sabe-se que a enxaqueca é a segunda causa de incapacidade no mundo e a primeira em indivíduos abaixo dos 50 anos.
A dra. Alessandra Falcão é neurologista em São Paulo e preza por um atendimento individualizado e humanizado, dando atenção detalhada a queixa de cada paciente. Se você suspeita que pode ter enxaqueca ou tem dor de cabeça com necessidade de analgésico mais de 2 vezes por semana, não deixe de agendar uma consulta para ser avaliado e tratado da melhor forma.
Você sabia que a crise de enxaqueca apresenta fases?
A enxaqueca é uma doença que apresenta 4 fases durante a crise: PRÓDROMO, AURA, DOR DE CABEÇA E FASE DE RESOLUÇÃO ou PÓSDROMO. Nem sempre encontraremos todas elas durante uma crise. Por exemplo, o paciente pode ser portador de enxaqueca sem aura. Você sabia que embora menos frequente, em alguns pacientes a crise de enxaqueca pode se manifestar com as outras fases mas sem a fase de dor? Por isso a importância de ser avaliado por um neurologista para ser adequadamente investigado.
- PRÓDROMO: pode durar até 72 horas e pode se manifestar de diferentes formas como fadiga, irritabilidade, alteração do sono, bocejos frequentes, dificuldade de concentração e até mesmo compulsão alimentar, por doces, por exemplo.
- AURA: surge de maneira gradual, NÃO SÚBITA!. Costuma durar de 5 a 60 minutos e pode se apresentar na forma de sintomas visuais (cerca de 90% das auras) como “raios de luz”, “pontos pretos ou brilhantes” na visão, perda transitória da visão, formigamentos e dormência pelo corpo, alteração da fala transitória, tontura entre outros
3. DOR DE CABEÇA: costuma durar de 4 a 72 horas. Além do quadro de dor que é predominantemente pulsátil/latejante, muitas vezes iniciando-se de um lado só da cabeça, podemos notar náuseas, vômitos, sensibilidade a luz, ao somou ao cheiro, dor na região do pescoço além de sintomas de alteração do humor
4. FASE DE RESOLUÇÃO ou PÓSDROMO: duração de 24 a 48 horas após a dor; muitos pacientes descrevem como uma sensação de “ressaca” após a dor, com alteração de concentração, fadiga, dor de cabeça leve, humor eufórico ou deprimido.
Preciso fazer algum exame para o diagnóstico?
Não! O diagnóstico da enxaqueca depende principalmente da história e da clínica do paciente. Mas sempre somos questionados: não é necessário mesmo solicitar tomografia ou ressonância? Como tudo, para toda regra existe exceção. Devemos fazer uma investigação mais detalhada, inclusive com a realização de exames de imagem se a dor de cabeça (cefaléia) apresentar algum sinal de alerta (“red flags”). E quais seriam eles?
- febre ou sinais meníngeos
- cefaléia nova com início após os 50 anos
- mudança do padrão da dor de cabeça
- outros sinais neurológicos associados como confusão, perda de consciência, alteração de força entre outros
- dor que atinja sua intensidade máxima em 1 minuto (muitas vezes descrita com uma sensação de “pedrada na cabeça”)
- dor de cabeça que desperte o paciente durante à note
- cefaléia que piore com esforço, tosse, orgasmo
- dor de cabeça associada a outros sintomas após TCE (traumatismo craniano) mesmo que leve: vômitos, tontura, confusão, sonolência…
Nesses casos é mandatória a investigação de possíveis diagnósticos diferenciais.
A enxaqueca piora na gestação e na menopausa?
A enxaqueca é uma doença que na infância apresenta uma proporção semelhantes entre meninos e meninas, porém, após a puberdade, principalmente após o primeiro ciclo menstrual ela é mais frequente no sexo feminino.
Durante a gestação, pode-se observar uma melhora da enxaqueca em até 70-80% das mulheres (isto provavelmente, pois diferente da menstruação, onde há oscilação do estrógeno no organismo da mulher com consequente desequilíbrio químico cerebral, durante a gestação isto não ocorre). Por outro lado, neste período é bem menor o arsenal terapêutico que pode ser usado e qualquer piora ou mudança do padrão da dor tem de ser avaliado com muito rigor para afastar outras causas de cefaléia durante a gestação.
Após a menopausa pode haver uma melhora da enxaqueca em cerca de 50% das mulheres, mas não é uma regra. Existem mulheres que pioram da enxaqueca após a menopausa.
Enxaqueca é genética?
A enxaqueca é uma doença multifatorial. A predisposição genética a enxaqueca é hereditária. Ou seja, se você tem predisposição genética a enxaqueca e é exposta a certos fatores ambientais e comportamentais ela poderá se manifestar. Contudo se você não apresenta essa predisposição, mesmo exposto aos mesmos fatores do primeiro caso, não desenvolverá a doença.
Existe dieta para tratamento da enxaqueca?
A resposta é NÃO. Hoje já sabemos que suspender uma lista de alimentos de todos os portadores de enxaqueca não é solução para o problema. Existem sim possíveis gatilhos para a crise de dor mas eles podem variar muito entre quem tem a doença; então mais importante do que grandes restrições é tentar identificar possíveis gatilhos para cada indivíduo. E qual seria a melhor forma de fazer isso? Através do DIÁRIO DA DOR.
O diário da dor deverá ser preenchido pelo paciente. Neste diário serão anotados os dias da dor, intensidade, necessidade de analgésico, sono, alimentação, menstruação etc. Este diário será como um guia para o neurologista para avaliar intensidade e frequência da dor, possíveis gatilhos, eficacia do tratamento entre outros.
Os gatilhos para a enxaqueca podem ser muitos: alimentos (embutidos, queijos, chocolate, alimentos estimulantes, bebida alcoólica, café, aspartame, alimentos termogênicos como gengibre e canela entre outros), privação ou excesso de sono, jejum, mudança de temperatura, sol, alteração hormonal, tabagismo, ansiedade e depressão. Os transtornos do humor e do sono além de poderem funcionar como gatilhos, podem ser sintomas da enxaqueca.
O que pode levar à enxaqueca crônica?
Enxaqueca crônica ocorre quando o indivíduo apresenta mais de 15 dias de dor de cabeça por mês por pelo menos 3 meses. É uma condição extremamente debilitante com impacto na vida pessoal, social e trabalho de seus portadores. Entre os pacientes com enxaqueca crônica, por exemplo, cerca de 70% apresentam sintomas depressivos associados. Dentre as principais causas de cronificação:
- Abuso de analgésicos, muitas vezes sem indicação médica: aumenta o risco em 20 vezes
- Frequência: > 8x/mês aumenta risco em até 30 vezes
- Transtornos do humor: aumenta o risco em 3 vezes
- Obesidade ou baixo peso
- Ronco
- Ingesta de cafeína diária
- Transtornos alimentares (ex: compulsão)
- Náuseas persistentes e frequentes
- Anticoncepcional com estrogênio
Enxaqueca pode causar AVC?
Uma pergunta muito frequente em consulta é se a enxaqueca pode levar ao AVC. Muitas vezes a dor é tão intensa que este passa a ser um medo frequente. Porém a intensidade da dor NÃO aumenta o risco de AVC. Algumas situações porém podem aumentar esse risco. São elas:
- Enxaqueca com aura: aumenta o risco em até 3 vezes
- se essa paciente utilizar anticoncepcional com estrogênio esse risco aumenta em até 6x
- se essa paciente ainda for tabagista o risco pode aumentar em até 9x
- se essa paciente utilizar anticoncepcional com estrogênio esse risco aumenta em até 6x
Paciente com enxaqueca com aura portanto deve sempre conversar com sua ginecologista para avaliar o melhor método anticoncepcional e não deve fumar.
Enxaqueca tem cura?
A resposta é NÃO. A enxaqueca é uma doença complexa, limitante, hereditária e que embora não tenha cura, tem TRATAMENTO, CONTROLE e pode entrar em REMISSÃO.
Para o tratamento da enxaqueca muitas vezes é necessário um tratamento multidisciplinar.
Pilares importantes no tratamento são: dieta saudável, atividade física, manejo do estresse e tratamento adequado de doenças associadas como depressão e ansiedade, evitar gatilhos identificados da dor, NÃO se automedicar. Práticas de relaxamento e mindfullness também podem auxiliar.
Em relação ao tratamento medicamentoso existem 2 pilares:
- Tratamento das crises de dor, feita principalmente através de medicações analgésicas
- Tratamento profilático que tem por objetivo redução de frequência e intensidade da dor além de melhora da qualidade de vida. A profilaxia é instituída principalmente se paciente necessitar de analgésico mais de 2 vezes por semana ou se apresentar dores limitantes. Existem várias classes de medicações que podem ser usadas com esse intuito, sendo que a escolha é feita de acordo com as características e comorbidades de cada paciente; outra opção seria o tratamento com toxina botulínica
Se você apresenta necessidade de analgésico mais de 2x/semana ou se se identificou com qualquer característica acima não deixe de agendar uma consulta com neurologista.
Links úteis: Enxaqueca: inimiga invisível